terça-feira, 23 de abril de 2013


NADA PARA ACRESCENTAR

NO MOMENTO

Por: H. James Kutscka 


Sentado frente à tela iluminada do computador com o olhar perdido na folha branca emoldurada em azul celeste repleta de instruções do Word, apalpava ideias com mãos imateriais como quem escolhe no caixote do supermercado uma fruta no ponto para o consumo imediato.

Passado algum tempo nesse exercício espiritual encontrou uma que parecia apetitosa.

Ironicamente; “o sentido da vida é a morte”.

Tendo colhido essa ideia, divagado algum tempo sobre suas implicações e certo de haver entendido o conceito, se deu conta de que cada minuto de vida contemplando aquela tela vazia era um minuto irremediavelmente perdido. Uma vitória do tempo sobre a perseverança. Da entropia sobre o instinto de preservação.

Sendo assim sem perder tempo suicidou-se mentalmente de inúmeras maneiras.

Primeiro das formas que em teoria seriam indolores, como overdose de calmantes. Entusiasmado com o resultado seguiu em uma escalada para o Gran Guiñol, subitamente percebeu que a espetaculosidade do processo seria elemento importante para a catarse.  Tomou estricnina e morreu se contorcendo e espumando pela boca ( havia visto espiões se suicidando desta forma em filmes para evitar a tortura de um interrogatório) foi um suicídio onde não faltou referências.

Afinal nada mais aborrecido do que um suicídio levado a cabo com o uso de calmantes. Coisa de gay.

Cortou os pulsos em uma banheira de água quente e sangrou até a morte, sufocou-se com um saco plástico na cabeça enquanto praticava o ato solitário, no mais puro estilo inglês.

Saltou de um prédio. A última coisa que passou por sua cabeça foi a visão de uma formiga carregando uma folhinha quando estava a milionésimos de segundos de espatifar sua cabeça na calçada esburacada há mais de 200 quilômetros por hora.

Para o “gran-finale” deixou o Hara Kiri, morreu de joelhos contemplando as próprias tripas emporcalhando o “tatami” à sua frente.

Quando finalmente o coração parou, desabou de cara em suas entranhas em um espetáculo de absoluto mau gosto.

O processo de múltiplos suicídios não durou mais de quarenta minutos.

Fato consumado e com a certeza de ter esgotado o potencial daquela ideia, deu-se uma nova vida

Por trás da tela branca que continuava a dominar seu campo de visão estavam inúmeras histórias esperando para serem escritas.

Agora era só uma questão de escolher as teclas certas e “done”.

Voltou então sem pressa a apalpar ideias como se estivesse escolhendo uma fruta no ponto para ser degustada em um caixote de supermercado.


22/02/13

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