Sobre o touro, a tourada e o toureiro.
Por H. James Kutscka
Espanhóis, ah os espanhóis!
Lembro da história do naufrago de uma nau espanhola que quase
à beira da morte, tendo sido encontrado em uma praia por um habitante de uma
ilha desconhecida lhe pergunta: - En esa tierra hay gobierno?
Ao receber a resposta de que sim, imediatamente quase sem
folego responde: - Entonces yo soy contra!
Espanhóis são por natureza polêmicos, questionadores,
turrentos (que me perdoem meus amigos espanhóis, mas como muito bem se expressa
o grande cantor catalão Juan Manuel Serrat, nas palavras do grande poeta Antonio
Machado: “ nunca es triste la verdade, lo que no tiene es remédio)
O esporte nacional deles é de uma violência ímpar, a
tourada.
E houve até mesmo quem as defendesse até fora do país.
Ernest Hemingway por exemplo, que se vangloriava de ter
assistido mais de mil e quinhentas delas e sobre a experiência teria declarado:
“A praça de touros é o único lugar onde se pode ver a morte violenta agora que
as guerras acabaram, queria muito ir a Espanha onde pudesse estudá-la. Estava
tentando aprender a escrever, começando com as coisas mais simples, e uma das
coisas mais simples de todas e a mais fundamental é a morte violenta”.
Sobre o toureiro e os aficionados escreveu: “O matador deve
ter um gozo espiritual do momento de matar. Matar de forma limpa e de forma que
lhe dê prazer estético e orgulho sempre foi um dos maiores prazeres da raça
humana”, palavras do homem que de forma muito pouco estética, para dizer o
mínimo, tirou a própria vida com um fuzil de caça.
O sol se punha de forma patética e deselegante para o autor
de “O sol também se levanta”, livro onde deixa claro seu fascínio pelas touradas.
Sobre o gênio dos espanhóis, e ainda sobre touradas, assunto
do início deste artigo teria dito: “O aficionado não quer ver um bom matador
morto, embora possa ser indiferente aos ferimentos de um mau matador, chegando
mesmo a tentar atingi-lo com garrafas e outros objetos ao deixar a arena”.
Embora admire o escritor, não posso deixar de criticar seu
gosto, pessoalmente não vejo nenhuma graça em um alfenim melindroso vestido com
uma roupa justa cheia de lantejoulas que com uma capa vermelha, faz de bobo um
animal magnífico previamente ferido por uma quadrilha de bandarilheiros, antes
de matá-lo covardemente.
Espero que meus leitores me desculpem por toda essa longa
introdução ao tema, mas é que diante dos últimos fatos foi inevitável a
comparação.
Vou falar sobre o espetáculo covarde proporcionado na
última segunda feira com nosso atual presidente como convidado, naquele canal
de esgoto em que se transformou a Globo.
O que vi não foi uma entrevista, foi uma verdadeira tourada
onde dois toureiros mambembes tentaram abater um touro previamente ferido por
seus pares, a quadrilha das bandarilhas (e no contexto o nome vem mesmo a
calhar) do consórcio da imprensa.
Na Espanha as touradas são protegidas pela constituição,
consideradas patrimônio cultural. O que se viu aqui foi uma tentativa infame de
massacre da reputação de um homem.
Quanto à nossa Constituição, ela tinha sido usada no
banheiro do camarim dos repórteres para higienização de seus dutos excretores
antes da entrevista.
Para alegria de quem como eu sempre achou as touradas uma
covardia, desta vez vimos o touro sair do embate vivo e mais forte, enquanto os
dois toureiros saíram feridos e enxovalhados nas redes socias.
Só faltou mesmo o “touro” cortar uma orelha de cada um dos
embasbacados toureiros e atirar para a plateia.
Quem sabe (como se referiu Hemingway aos aficionados
desiludidos com o toureiro) ainda os veremos nas ruas expostos à execração
pública sendo atingidos por garrafas. Garrafas
pet levinhas, é claro, pois assim como não queremos que nada de mal aconteça ao
touro, também não queremos que nenhum animal, mesmo que global se machuque.
Pensavam ser uma morte anunciada como as das “Plazas de
Toros” e se deram mal, mas voltando a Hemingway, podemos agora responder “por
quem os sinos dobram”, eles dobram pelos dois toureiros mequetrefes e pela
emissora que os escalou para o espetáculo.
O pretenso sangue na areia é apenas mais uma mentira da
emissora, não passa de ketchup.
Já na quinta-feira da mesma semana não houve tourada, foi a
vez do burro. Durante a entrevista os mesmos toureiros agora travestidos de repórteres,
só faltaram abrir uma pinga para beber com o animal ladrão e cachaceiro,
enquanto lhe passavam por baixo do olho da câmara, um papel com as respostas às
perguntas.
O que se viu foi a natural empatia entre animais da mesma
espécie.
Talvez o perdão de uma dívida bilionária da emissora para
com o fisco tivesse aparecido na mesa de negociação antes do escárnio
televisivo.
O caminho para o inferno com o aval do judiciário e da
velha mídia nunca foi tão escancarado.
O futuro e a liberdade nesse país, mais do que nunca,
depende de nós e das Forças Armadas, torçamos para que se necessário elas
cumpram seu dever.
Nesse país não sacrificamos touros para diversão da massa ignara.